Histórias, algumas reais

quinta-feira, 5 de março de 2009

Dipsy

Na 1ª vez que corri, fiz 50 minutos. Um exagero para a minha condição física, idade e características individuais.

Um erro consequente da minha inexperiência, e indo contra o conselho técnico dos meus amigos que já corriam há uns anos. Acabei o treino a coxear.
No dia seguinte mal podia andar, mas ainda o pior foi ter gasto quase por completo a sola dos...pés! Sim dos pés! É que achei que devia correr descalço. Adepto da vida saudável e amigo da natureza, achei que o mais natural era correr descalço.

Também até hoje ainda não encontrei umas sapatilhas que se adaptassem às minhas extremidades (pés). Por isso continuo a correr descalço. Com a continuação acaba-se por formar um calo bastante resistente.

Nunca participei em provas. Nem sei se gostaria. Parece-me muita confusão, demasiada gente, trânsito, betão e poluição. Prefiro treinar no pinhal, quase sozinho, na companhia dos pássaros, coelhos, árvores e mais alguém. Quase todas as manhãs, lá pelas 5:45 hrs, lá ando eu correndo à minha maneira no meio da natureza.

O mais giro que me aconteceu nestas aventuras foi numa certa manhã ter encontrado uma linda fêmea passeando pelos mesmos caminhos. Ela mostrou-se receptiva e lá fomos os dois dar uma voltinha juntos. Deixou-me doido a miúda. Esqueci-me completamente das pessoas queridas que tinha em casa à minha espera, esqueci-me do treino e desaparecemos os dois pelo matagal. Depois...ela foi à vida dela e eu dei por mim perdido no pinhal. Desorientei-me e já nem sabia o caminho para casa onde as pessoas que mais me querem já estavam certamente preocupadas. Voltas e mais voltas e lá dei com o caminho.

Que alívio! Que felicidade ser de novo abraçado por quem mais amo! Mas confesso que não sei se me serviu de emenda...

Ah... Falta dizer que me chamo Dipsy e que em muitos dias é graças a mim que a minha dona se levanta de madrugada para ir correr. A propósito, sabem que os vossos amigos peludos de 4 patas podem muito bem ser uns óptimos companheiros de corrida? Mas não se esqueçam que temos de levar identificação connosco para o caso de termos uma aventura parecida...

Ana Pereira, 2001

A Conquista do King

Ana acabou de se divorciar. E na busca incessante da felicidade saiu da sua casa palacial, e foi viver para um sotão alugado. Leva consigo a sua riqueza: a sua filha Inês, sem a qual não lhe seria possível viver.

Aquando da primeira visita ao sotão que veio a alugar, foi recebida agressivamente por dois cães sem raça que viviam naquele quintal, por onde elas teriam de passar para aceder à casa. Eram o Roby e o King.

O Roby tinha um focinho doce, pêlo castanho dourado, luzidio, e acabou por se revelar um vulgar cachorro brincalhão. O King era feio. Rafeiro autêntico, vira-latas, preto, mas já com muitos pêlos brancos da idade, uma orelha caída, partida pelos maus tratos da vida. Pêlo áspero, apesar dos banhos a que era sujeito periodicamente pelos donos cuidadosos. O King não inspirava qualquer simpatia. Era feio, agressivo e antipático.

Aos poucos, Ana foi perdendo o medo. Começou por lhes dar bolachas para que os cães gostassem dela. E resultou. Em pouco tempo, já conseguia entrar e sair de casa sem grandes complicações.

Um dia, vem o Scooby viver com eles (um Terrier agitado e desafiador). O Roby não se importou, mas o King sentindo o seu terreno ameaçado, não gostou nada! Assim como a pequena Inês, que via naquele monte de pêlos em movimento uma ameaça constante.
O Scooby saltitava, não parava, atirava-se às pessoas, punha-lhes as patas em cima exigindo atenção.

Um dia pôs-se de pé em cima da Inês, o que significa patas no pescoço e focinho na cara da miúda, que arranhada e assustada desatou a chorar. Ana gritou com o Scooby, que cobardemente fugiu, e não é que o King desatou a rosnar para o Scooby e daí para a frente nunca mais permitiu que ele se aproximasse sequer da Inês!? Com isto, a pequena Inês, e a Ana começaram a gostar do King, e davam-lhe festinhas e bolachinhas.

Mas o mais impressionante foi o primeiro dia em que o pai da Inês a foi buscar para passar o fim de semana com ela. Sendo a primeira vez, a Ana levou a filha ao portão, e ficou a vê-la entrar no carro do pai, disse-lhe adeus, com uma nostalgia só explicável a quem já passou pelo mesmo, e agarrada às grades do portão, vendo a mãozinha a filha a acenar-lhe e a afastar-se, vêem-lhe as lágrimas aos olhos, e é então que sente um corpo quente e forte encostar-se a si. Era o King! De pé, com as patas nas grades, completamente encostado à Ana, olhando a menina que ia embora, partilhando em perfeita sintonia os sentimentos dela, se vira e lhe dá uma lambidela, acariciando-a com os seus olhos castanhos, com a ternura infinita que só é possível encontar no olhar de um cão! Acho mesmo que o King também chorou naquele momento.

E a partir daí, definitivamente, o King conquistou o coração da Ana e também da Inês, ensinando-lhes que, à semelhança de tantas coisas na vida, aquele cão de mau aspecto não era afinal o que parecia! O King revelou-se um verdadeiro amigo, e hoje é-lhe tão difícil separar-se delas como dos próprios donos!

2002

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

MARATONA DE PARIS 2001 - a minha 1ª Maratona



"Et Voilá! Portugal, un grand pays!".


Levanto os braços e avanço triunfante para a meta, completando pela primeira vez os 42.195 m da maratona. Aquelas palavras foram o melhor dos prémios que alguma vez tive. Sou uma verdadeira vencedora.


Quatro meses de treino específico, interrompido pelo aparecimento e cura de uma fractura de stress. Muitas horas a correr. À chuva, de noite, sózinha, e com o meu cão.Entusiasmo e desânimo. Sentir as lágrimas nos olhos ao som dos carrilhões de Mafra e mal conseguir avançar com dores na canela. Correr 20 minutos e parar a coxear, quando o treino deveria ser de 1h30m. Pensar em desistir da maratona. Pensar em desistir de correr. Quatro meses de dor, sofrimento, incertezas, ânimo e desânimo.


Não desisti!!!


A fractura sarou e consegui fazer a maratona e sou anunciada à chegada à meta. Eu que levei 4h04m!!


Duro?Não!Foi fácil! com algum treino (o que foi possível) e com toda a ajuda do público e da excelente organização foi fácil! Duros foram os quatro meses antecedentes. Mas valeu o esforço.
Quando cheguei ao km 41, tive mesmo pena de só faltarem 1195 metros para aquela festa acabar. Aproveitei e vivi intensamente cada metro que me faltava, como aconselhava a organização, à qual dou a nota máxima, assim como ao público. Nestes últimos metros um palhaço ofereceu-me uma flor, que vou guardar para sempre, assim como a recordação desta experiência absolutamente fantástica e inesquecível.


E em Lisboa..., como seria?

Ana Pereira, Abril 2001